
A cena que Hugo Motta tentou esconder dos cidadãos brasileiros, ao desligar o sinal da TV Câmara e expulsar os jornalistas do plenário, revela não apenas a truculência do presidente da Câmara, mas sua incapacidade de lidar democraticamente com a situação explosiva que ele mesmo criou.
Motta preparou o incêndio com pautas “surpresa” de alto teor político – o PL para salvar Bolsonaro e duas cassações de deputados –, criou confusão previsível e depois jogou a força bruta contra parlamentares, inclusive contra uma mulher indígena, a deputada Célia Xakriabá (PSOL-MG). Também censurou a imprensa, sem poupar nem a TV pública que existe para dar transparência à Casa dos “representantes do povo brasileiro”.
Apesar da ressalva que se repetiu no noticiário, com jornalistas condenando o gesto do deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) e comparando-o com o motim de deputados da extrema direita em agosto, é bom destacar que, embora nos dois casos a cadeira do presidente da Câmara tenha sido usurpada, a violação de regras teve motivações, alcance e, principalmente, consequências bem diferentes, como denunciou o próprio deputado do PSOL da cadeira da presidência, de onde foi arrancado com violência pela polícia legislativa a mando de Motta.
O motim da direita foi um espetáculo que durou mais de 40 horas, transmitido ao vivo pela TV, em que uma deputada chegou a sentar na cadeira da presidência vestida de santa e com um bebê no colo. O objetivo dela e de outros deputados bolsonaristas era protestar contra uma decisão da mais alta corte da Justiça – em clara invasão de poderes –, que havia colocado Jair Bolsonaro em prisão domiciliar, e obter anistia flagrantemente inconstitucional para os golpistas, negociada em conchavos com o centrão no gabinete do ex-presidente da Câmara Arthur Lira, o eterno. Ninguém foi punido até o momento.
Nos dois casos, é verdade, Hugo Motta fez papel de bobo, mas enquanto no primeiro colocou o rabo entre as pernas, no segundo apelou para a violência para remover da cadeira (que comprovadamente não merece ocupar) um único deputado que ali estava há duas horas, cercado de colegas, também atingidos pela polícia legislativa, que tentavam acalmá-lo.
Glauber protestava contra a votação de sua cassação por quebra de decoro parlamentar, depois que seu delito (confrontar fisicamente um militante do MBL que o perseguia com ofensas) foi amplificado pela antipatia dos colegas, sobretudo de Arthur Lira, por ter denunciado o orçamento secreto. Também se insurgia contra a votação surpresa do projeto casuístico da “dosimetria”, que pode livrar Bolsonaro da maior parte do tempo que tem a cumprir na cadeia, onde está por determinação do STF, depois de passar por um processo penal conduzido publicamente, com apresentação de provas e amplo direito de defesa.
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