"No momento, domesticamente, o país está muito dividido, tem muito tumulto político, muita divisão, muita polarização. Estamos vendo ainda o que vai acontecer com o ex-presidente [Donald] Trump e sua candidatura em meio a vários processos que estão tendo lugar contra ele. O Biden tem certamente um posicionamento com a Rússia bem diferente do que Trump tinha, mas o apoio para Israel é uma das certezas intocáveis da política norte-americana."
Questionado se Putin estava certo quando afirmou que os EUA
precisam de caos no Oriente Médio, pois isso seria benéfico para os interesses do país na região,
Paoliello diz que o presidente russo "tinha certa razão".
"Eu acho que ele tem certa razão, que é o interesse econômico [dos EUA], a movimentação dessa máquina de guerra, digamos, o complexo militar industrial, que é muito dependente de que os Estados Unidos mantenham na sua política externa conflitos ativos ou que eles estão envolvidos diretamente", diz o especialista.
Já sobre a capacidade de Biden de equilibrar o apoio à Ucrânia e a Israel, Paoliello diz que ele "tem dado privilégio para a relação com Israel, e que essa decisão passa por várias camadas".
"Eu acho que a relação com Israel é uma relação estratégica de longo prazo, apesar de ser difícil dizer quais são os ganhos estratégicos para os Estados Unidos e para Israel. Em geral, isso tem sido interpretado muito mais [...] pelo lado da influência que determinados setores pró-Israel têm dentro dos Estados Unidos. Interesses econômicos, interesses ideológicos, mas também relacionados a grupos de interesses específicos."
Ele ressalta também a capacidade de influência do lobby pró-Israel nos EUA. "Acho que é importante também fazer essa ressalva aqui. Não é apenas um lobby judaico. O lobby evangélico, por exemplo, o lobby cristão pró-Israel, é crucial para entender a questão dos Estados Unidos."
Porém, ele destaca o crescimento das manifestações do público pró-Palestina nos EUA. "Eles não são tão influentes [quanto o lobby pró-Israel] em Washington, no Congresso, na Casa Branca, mas têm um impacto grande para a opinião pública."
Kenkel, por sua vez, tem uma visão mais comedida ao citar o lobby pró-Israel nos EUA. "Acho que quando a gente fala em lobby judeu nos Estados Unidos, […] tem que ter extremo cuidado com essa expressão. Porque a população judia, nem nos Estados Unidos, nem em outro lugar, nem em Israel não tem um posicionamento político monolítico."
Segundo ele, a população judia nos Estados Unidos abrange todo espectro de posições políticas.
"O que a gente tem nos Estados Unidos é uma principal organização que se chama AIPAC, que é o American Israel Political Action Committee, que tem muita influência, mas com um posicionamento muito claro, que a gente pode chamar de pró-governo israelense atual, pró-certas políticas sionistas, que tem certo posicionamento com respeito à ocupação, mas esse termo 'lobby judeu' é um pouco demais", argumenta o especialista.
Por fim, ele alerta para o que pode vir após o término da ofensiva israelense na Faixa de Gaza, afirmando que atualmente nenhum país tem um plano concreto para o que pode emergir após o que classificou como "espasmo militar".
"Quando isso acabar, seja lá qual for o resultado, ninguém tem um plano para o que virá depois disso. De um lado, Israel não quer reocupar [a Faixa de Gaza] por enquanto. Do outro lado, não vejo os palestinos aceitando voltar para a situação anterior, seja na Cisjordânia, seja em Gaza. Então, tem que ter algum pensamento já para o plano para depois. Isso, aliás, é o mesmo problema que a gente vem tendo desde o início com a Ucrânia. Em algum momento, a gente vai ter que reintegrar a Rússia na arquitetura de segurança europeia a longo prazo."