Mais de 400 pessoas na Faixa de Gaza, entre elas feridos e estrangeiros, foram autorizadas a atravessar a fronteira com o Egito nesta quarta-feira (01/11). É o primeiro grupo a deixar o enclave palestino em mais de três semanas de conflito entre o grupo fundamentalista islâmico Hamas e as forças de Israel.
Imagens de agências de notícias mostraram famílias inteiras carregando seus pertences e várias pessoas feridas em cadeiras de rodas, bem como ambulâncias cruzando os portões fortemente fortificados da passagem de Rafah, a única na fronteira de Gaza não controlada por Israel e por onde tem entrado ajuda humanitária limitada ao território palestino.
Segundo uma fonte diplomática, a passagem foi aberta na sequência de um acordo firmado entre Egito, Israel e os governantes do Hamas em Gaza, sob mediação do Catar em coordenação com os Estados Unidos.
Uma autoridade egípcia em Rafah informou que, ao todo, 76 palestinos feridos e 335 estrangeiros ou cidadãos com dupla nacionalidade atravessaram a fronteira em direção ao Egito nesta quarta. A passagem deverá ser aberta novamente nesta quinta para mais pessoas.
Segundo o embaixador brasileiro na Cisjordânia, Alessandro Candeas, não há brasileiros nessa primeira lista. "Acredito que em breve novas listas serão publicadas, e espero que nossos brasileiros estejam nelas", disse, segundo o jornal Folha de S. Paulo.
A Embaixada do Brasil na Palestina monitora a situação de 34 pessoas que pediram ajuda para deixar o enclave, sendo 24 brasileiros, sete palestinos em processo de imigração e três palestinos que darão início à imigração. O governo brasileiro tem articulado com autoridades egípcias e israelenses a repatriação dessas 34 pessoas, por meio da passagem de Rafah.
Governos estrangeiros afirmam que, entre os 2,4 milhões de pessoas que vivem na Faixa de Gaza, há titulares de passaportes de 44 países, bem como de 28 agências, incluindo organismos da ONU.
O território sitiado vem sofrendo semanas de bombardeios incessantes por parte de Israel, e até pouco tempo atrás nem ajuda humanitária estava sendo autorizada a cruzar a fronteira de Gaza.
"Estamos sobrecarregados... Tenham piedade de nós. Somos egípcios e não podemos entrar em nosso país", disse à agência de notícias AFP Umm Yussef, que tem dupla nacionalidade, palestina e egípcia. "Deixe-nos entrar. Estamos exaustos. Não conseguimos dormir nem comer."
Autoridades de Gaza, controlada pelo Hamas desde 2007, disseram que cerca de 8.800 palestinos, a maioria civis, incluindo mais de 3.500 crianças, já foram mortos desde que Israel iniciou ataques aéreos no enclave, em retaliação à ofensiva terrorista de 7 de outubro, quando membros do grupo palestino massacram 1.400 pessoas em território israelense e fizeram mais de 200 reféns.
Repórteres da AFP relataram ter visto mais tanques israelenses atravessando a fronteira do país para o norte de Gaza, enquanto Tel Aviv intensifica sua incursão terrestre.
Imagens fornecidas pelos militares mostraram tropas vasculhando casas bombardeadas em busca de membros do Hamas e de reféns capturados pelo grupo.
Israel disse que 16 de seus soldados foram mortos em "batalhas ferozes" com o Hamas "nas profundezas da Faixa de Gaza" desde o início das operações terrestres em Gaza, na última sexta-feira. O braço armado do grupo, as Brigadas Ezzedine al-Qassam, prometeu transformar Gaza em um "cemitério" para as forças invasoras.
Um ataque ao maior campo de refugiados do enclave palestino matou cerca de 50 pessoas na terça-feira – incluindo um membro do Hamas envolvido nos ataques de 7 de outubro, segundo informou Israel.
Uma grande explosão atingiu o campo de Jabalia, densamente lotado, antes do anoitecer, arrancando as fachadas dos prédios próximos e deixando uma cratera profunda e cheia de destroços.
O morador Ragheb Aqal, de 41 anos, comparou a explosão com "um terremoto" e disse ter visto "casas enterradas sob os escombros e partes de corpos, mártires e feridos em grande número".
Israel afirmou que seus aviões de guerra atingiram um "vasto" complexo de túneis no local, matando "muitos terroristas do Hamas", inclusive o comandante do batalhão local, Ibrahim Biari.
O Hamas, por sua vez, disse que o bombardeio israelense matou sete reféns entre os mais de 200 que estão em seu poder desde 7 de outubro. Com isso, segundo o grupo, já são 50 reféns mortos até agora por ataques israelenses.
O ataque ao campo de Jabalia provocou um coro de condenações por parte do Catar, da Arábia Saudita e também da Bolívia, que cortou relações diplomáticas com Israel em protesto – uma decisão que Tel Aviv classificou como "rendição ao terrorismo". Já os presidentes do Chile e da Colômbia afirmaram que convocaram seus embaixadores em Israel para consultas.
A tão esperada abertura da fronteira com o Egito proporcionou o primeiro vislumbre de esperança na crise humanitária crescente em Gaza, que a ONU e outras agências de ajuda humanitária descreveram como "sem precedentes".
A situação em Gaza continua desesperadora, com falta de alimentos, combustível e medicamentos para os 2,4 milhões de habitantes do enclave, de acordo com grupos de ajuda humanitária.
Cirurgiões estão realizando amputações no chão de hospitais sem anestesia, e crianças são forçadas a beber água salgada, relatou Jean-François Corty, vice-presidente da ONG Médicos do Mundo, que tem 20 funcionários no local.
Autoridades israelenses disseram que 70 caminhões com ajuda foram autorizados a entrar em Gaza a partir do Egito na terça-feira, um dos maiores fluxos desde que um acordo foi negociado com os Estados Unidos, mas muito menos do que os grupos humanitários dizem ser necessário.
Temendo que os suprimentos que entram em Gaza possam ser desviados para o Hamas, ou que os carregamentos de ajuda possam esconder armas ou outros suprimentos, o pessoal de segurança de Israel realiza inspeções rigorosas que reduziram o fluxo de ajuda ao mínimo.
A agência de telecomunicações palestina disse nesta quarta-feira que os serviços telefônicos e de internet foram "completamente cortados em Gaza", o segundo apagão em uma semana.
Residentes palestinos que evacuaram o norte de Gaza, conforme exigido por Israel, disseram a agências de notícias que ainda estavam sob ameaça.
"Fomos informados de que as pessoas estão evacuando a Cidade de Gaza em direção à área central da Faixa, além do vale, então fomos para lá. Depois de 20 dias, fomos bombardeados. Três de nossos filhos morreram, e todos nós ficamos feridos", disse Amen Al Aqlouk à AFP.
"Não há esperança na Faixa de Gaza. Aqui não é mais seguro. Quando a fronteira for aberta, todos irão embora e emigrarão. Encontramos a morte todos os dias, 24 horas por dia."
ek/jps (AFP, Reuters, ots)
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