O mais novo desafio para Putin será a presidência do BRICS em 2024, que contará com seis novos membros — sendo eles Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Argentina, Egito, Irã e Etiópia.
Apesar de contar com países que ainda não experimentaram a dinâmica do agrupamento, as expectativas são boas.
"O BRICS renovado pode desempenhar um papel essencial no avanço dos esforços multilaterais no sentido da redução das rivalidades, da obtenção de progressos no desarmamento nuclear e do reforço da interação construtiva entre as nações", afirmou Sergio Duarte, presidente das Conferências Pugwash sobre Ciência e Assuntos Mundiais.
Índia e China: duas potências econômicas
Em 2022, segundo os últimos números do Fundo Monetário Internacional (FMI), a Índia se tornou a quinta maior economia mundial, ultrapassando o Reino Unido. O crescimento populacional — agora o país tornou-se o mais populoso do mundo, com 1,4 bilhão de habitantes — contribuiu para o crescimento do PIB do país.
Isso tem aumentado a busca dos países do BRICS em fortalecer a sua expansão da malha de negócios. Os interesses nacionais como prioridade, portanto, já começam a surgir.
"A Índia está caminhando muito gradualmente de uma atitude relativamente subserviente aos Estados Unidos para uma afirmação dos seus próprios interesses nacionais. O fato de a Índia — como parte do BRICS+ — ter saudado a adição do Irã ao bloco mostra que o país já não suporta a pressão dos EUA. O método da Índia para balancear sua relação com a China tem sido apostar na sua aproximação aos Estados árabes do golfo [Pérsico]", observa Prashad.
Possibilidades de aproximação para além do golfo não faltam. Yevgeny Griva, vice-comissário de Comércio da Federação da Rússia na Índia, já chegou a afirmar que Moscou tem grande interesse em ampliar o comércio Índia-Rússia, incluindo as exportações indianas.
“Principalmente nas esferas de petróleo e gás, de fornecimento de carvão da Rússia, de fertilizantes, mas esperamos alargar a gama de produtos a serem fornecidos aos mercados indianos", completou o oficial russo.
Em dados mais recentes, as
exportações de mercadorias da Rússia para a Índia
totalizaram US$ 41,2 bilhões (R$ 208,06 bilhões), em comparação com US$ 17,1 bilhões (R$ 86,36 bilhões) no ano passado. As exportações de mercadorias da Índia para a Rússia
aumentaram em 50%, para US$ 2,6 bilhões (R$ 13,13 bilhões).
Como resultado, o volume de negócios atingiu um valor recorde de US$ 43,8 bilhões (R$ 221,19 bilhões), tendo aumentado em 130% de janeiro a agosto do ano passado, com aumento de 20% em relação a todo o ano de 2022.
Esse rápido
crescimento do comércio permite que a Rússia continue sendo o quarto maior parceiro comercial da Índia e
o segundo mais importante fornecedor de mercadorias ao país.
Já a China, com sucesso, tem se firmado como agente central no panorama econômico internacional. Recentemente o yuan superou o euro e se tornou a segunda moeda mais importante no sistema SWIFT. O dólar, por sua vez, tem estado consistentemente abaixo de 85% desde dezembro do ano passado, o que não acontecia desde o início de 2018.
O yuan subiu pela primeira vez para o segundo lugar, tendo a sua cota aumentado 1 ponto percentual, para 5,8% durante o mês, um recorde absoluto para essa moeda.
O euro desceu uma posição nessa classificação: a sua cota nas
transações comerciais diminuiu 1 ponto percentual, para 5,43%.
Crítico à política bélica dos EUA, Xi Jinping, presidente da China, chegou a afirmar que "mudanças históricas estão ocorrendo no mundo moderno" e que "a modernização do mundo deve ser baseada nos princípios do desenvolvimento pacífico, da cooperação mutuamente benéfica e da prosperidade para todos", desafiando o conceito de nova ordem mundial trazido por Biden, que prega os EUA como agente central, ao mesmo tempo que financia o confronto entre Israel e Palestina e fornece armas à Ucrânia.
Os números também não mentem — e reafirmam o papel central da China na nova ordem econômica que se desenha no tabuleiro global. O país cresceu 4,9% no terceiro trimestre deste ano, superando a previsão de 4,5% de analistas, mas desacelerou em relação ao mesmo período do ano passado, quando a evolução foi de 6,3%, segundo dados publicados pelo governo.
Nos primeiros nove meses do ano, a economia da China cresceu 5,2% em comparação com o mesmo período do ano passado. Os dados ainda mostram que a economia chinesa está se recuperando de forma suficiente para atingir a meta de crescimento anual do país, de 5%.
Diante da encruzilhada, a pergunta: há saída para os EUA?
Não existindo vácuo de poder na política, os espaços têm de ser ocupados de forma rápida e estratégica. Diante da realidade emergente do BRICS+, os EUA e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) buscam alternativas que, apesar de já terem funcionado no passado, mostram-se pouco efetivas no presente.
Discursos mais gerais já surgem para justificar a possibilidade de um novo conflito com países como Rússia e China. O Comitê Militar da OTAN, por exemplo,
já expressou preocupação com a integração de ambos os países no Ártico, o que justificaria uma maior cooperação entre a OTAN e seus aliados para fazer um enfrentamento mais direto.
Para além do discurso, há a prática. Também em tempos recentes, aumentaram os exercícios nucleares Steadfast Noon, da OTAN, durante o qual diversas aeronaves táticas ensaiam lançamentos de bombas nucleares. O exercício é considerado uma espécie de provocação, principalmente direcionada às potências nucleares do BRICS+.
O aumento frequente de ações e manobras militares, porém, já não causa mais comoção internacional. Pelo contrário, só mostra que, dentro da nova ordem global que se desenha, países como a Rússia e a China têm forte capacidade de liderança.
"Os EUA e a OTAN utilizarão todos os meios para dividir os membros do BRICS+, particularmente através da campanha de pressão contra a Rússia e a China. Sem guerra, duvido que tenham sucesso", afirma Vijay Prashad.
A perda de influência dos EUA no Oriente Médio também é um fator crucial, principalmente diante da análise de que dos dez países que mais recebem dinheiro da nação,
seis se encontram em tal região geográfica.
O principal motivo para a derrocada norte-americana é justamente sua postura diante de conflitos. Rússia, China e Brasil são nações que receberam elogios extensivos por sua busca de negociações de paz, principalmente diante do Conselho de Segurança da ONU.
"A Rússia e a China podem formar uma coalizão de países em desenvolvimento, já que ambos os países têm capacidade diplomática especificamente com países não ocidentais. Isso criaria uma base significativa de apoio, podendo também pressionar Israel e o Ocidente", revelou o pesquisador Vasily Kashin à Sputnik.
A fraqueza do governo de Biden e a descrença na OTAN, inclusive, já surgem em expressões internas.
Em pesquisa realizada pela rede de televisão estadunidense CBS,
56% dos cidadãos americanos acreditam que o presidente americano está lidando com a situação de forma errada. O público americano está preocupado com
a escalada do conflito: cerca de
85% temem uma guerra maior no Oriente Médio.
Contando com a repercussão do povo e a opinião pública, as ações políticas devem ser cada vez mais pragmáticas e calculadas. As eleições norte-americanas, em 2024, trazem o ex-presidente Donald Trump como figura central de preocupação a Biden. Porém há realmente uma mudança no caráter do governo com a possível saída do atual presidente? Para Vijay Prashad, não muito, se analisada a essência do país.
"Os EUA são, na sua essência, uma potência imperialista que está vendo seu controle sobre o mundo enfraquecer. É duvidoso que consiga reforçar as áreas onde esses controles estão diminuindo — como o controle sobre as matérias-primas, sobre a ciência e a tecnologia e sobre as finanças. Os únicos dois controles que o país ainda mantêm são sobre as armas e sobre a informação. Com o ataque israelense aos palestinos, o controle sobre a informação enfraqueceu, e a bravura dos palestinos mostra que mesmo os sistemas de armas avançados não são suficientes para vencer", completa.