O primeiro-ministro israelense Ytzhak Rabin tinha acabado de fazer um discurso defendendo a paz com a Palestina diante de mais de cem mil pessoas em Tel Aviv. Ele estava caminhando para entrar no carro oficial quando recebeu dois tiros disparados por um militante judeu ortodoxo de extrema direita. Esse crime, em 1995, gerou convulsão social e jogou um balde água fria nas negociações entre os líderes políticos da região, que nunca mais chegaram nem perto de encontrar o caminho da paz.
Agora, 28 anos depois, em meio a um conflito terrível na Faixa de Gaza, um documentário sobre esse assassinato histórico vai estrear no Brasil. Dirigido pelo cineasta Amos Gitai, "O último dia de Ytzhak Rabin" conta em detalhes como foram as últimas horas do israelense que recebeu o Prêmio Nobel da Paz por seus esforços para acabar com a violência entre Israel e Palestina. O filme estreou lá fora em 2015, quando foi premiado no Festival de Veneza, mas só chega por aqui em novembro.
Filho de imigrantes judeus, nascido em Jerusalém, Ytzhak Rabin foi um soldado que virou político ao longo da vida. Ele era um comandante na primeira guerra entre Israel e os países árabes, em 1948, quando enfrentou tropas egípcias no Sul de Israel. Ocupava o cargo de chefe do Exército durante a Guerra dos Seis Dias, em 1967. Como ministro da Defesa, em 1988, Rabin fez pleno uso do poderio militar de seu país para esmagar as revoltas palestinas conhecidas como a Primeira Intifada.
Quando foi eleito primeiro-ministro pela segunda vez, em 1992, o político se viu governando um país em meio à perda do apoio da opinião pública internacional devido à maneira violenta como resolvia os conflitos, sem jamais romper com o ciclo de hostilidade entre palestinos e israelenses. Ele entendeu, de alguma forma, que a trilha do diálogo, da diplomacia, poderia ser um caminhho mais eficaz para dar um fim à sequência de confrontos e proteger seu próprio povo de organizações como o Hamas.
Em 1993, ele assinou, com o líder da Autoridade Palestina, Yasser Arafat, e o ministro das Relações Exteriores de Israel, Shimon Peres, os acordos de Oslo, que foram uma série de tratados para tentar findar a hostilidade na região, com mediação do então presidente americano, Bill Clinton. Entre outros termos, os acordos previam reconhecimento mútuo de ambos os estados e o estabelecimento de um governo palestino na Faixa de Gaza e na Cisjordânia, ambos territórios ocupados por Israel.
Na cerimônia de assinatura do documento, na Casa Branca, em Washington, Rabin gerou comoção quando falou, direcionando-se a Yasser Arafat, a seguinte frase: "A gente diz para vocês em alto e bom som: chega de sangue e de lágrimas. Chega!". Por esses esforços em prol do diálogo com adversários, em 1995, Ytzahk Rabin recebeu o Prêmio Nobel da Paz, dividindo a láurea com Arafat e Peres. Mas, no mês seguinte, aconteceu o crime que mudaria a história no Oriente Médio.
Os movimentos nacionalistas israelenses eram contra aos Acordos de Oslo. Representados pelo partido conservador Likud, do atual primeiro ministro, Benjamin Netanyahu, esses grupos não abriam mão do controle da Cisjordânia, por exemplo, e viam nos tratados uma ameaça à existência de Israel.
A equipe de segurança de Rabin insistiu para ele usar um colete a prova de balas no discurso que faria durante uma grande manifestação na noite de 4 de novembro de 1995, mas o israelense se recusou a acreditar que alguém de seu próprio país pudesse representar algum risco. O primeiro-ministro fez um pronuciamento vibrante em Tel Aviv, cantou e celebrou a esperança diante de uma praça entupida de gente. Ninguém imaginava que aqueles poderiam ser seus minutos finais da vida.
Quando estava chegando no carro oficial, Ytzhak Rabin foi atingido por dois tiros disparados por um extremista judeu de 25 anos chamado Yigal Amir. Naquele sábado, em respeito ao shabbat, sagrado para o Judaísmo, o estudante de Direito havia passado o dia repousando com a família em Herzliya, ao Norte de Tel Aviv. De noite, sabendo do discurso agendado pelo primeiro-ministro, pegou sua pistola semi-automática Beretta 84F e foi para a Praça dos Reis de Israel, hoje chamada de Praça Rabin.
Assim como a parcela ultranacionalista do país, Amir era contra qualquer negociação de paz com a Palestina e achava que o primeiro-ministro era um traidor por aceitar os termos de Oslo. Ele e seu irmão estavam orgnizando uma milícia antipalestinos. Em raras entrevistas depois do crime, o assassino disse que já havia ido a dois eventos com a presença de Rabin. Estava só esperando o momento certo. Naquele 4 de novembro de 1995, ao ver o político descer a escadaria rumo a seu carro, Amir, tranquilamente, sacou a arma e disparou.
O atirador foi condenado à prisão perpétua. Mas o plano deu certo. A morte de Rabin enfraqueceu o esforço para se alcançar os termos de Oslo e, desde então, a situação apenas se deteriorou.
Em 1996, liderado por Netanyahu, o partido nacionalista Likud, que havia perdido para os trabalhistas de Rabin em 1992, venceu as eleições para primeiro-ministro. Hoje, Israel tem um governo de extrema-direita, encabeçado por Netanyahu, que se mantém no poder apesar de suspeitas de corrupção e da violencia na região. No último dia 10 de outubro, a grupo terrorista Hamas realizou um massacre em Israel, que, em reação, vem borbadeando a Faixa de Gaza, deixando milhares de civis mortos.
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